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terça-feira, 26 de novembro de 2013

“E o Porto aqui tão perto”



I

Hoje acordo
e o Porto
sinuoso
insinuante
ali por perto
cidade
de recato
de recantos
com epiderme
de granito
e alma
maior
que o socalco.


“Ainda não deu hora nenhuma!" de Fernando Pessoa, pintura de Nadir Afonso

II

Espera-te
generosa
do tamanho
dos abraços
de todas
as suas pontes,
a gaiola
mágica
de S. Luís
replicando
pardais subtis
metálicos
e a dissonância
dos carris
e das viagens
virá depois
a da Arrábida,
emoldura
deslumbrados
salgueiros
acordeões
de neblina
inventam
o tango
no tráfego
das manhãs.


“Ponte de S. Luís” de Nadir Afonso

III

Entre ambas
espera-te
a silhueta discreta
o amante
improvável
no Cais da Ribeira
tu erecta
um pouco distante
luminosa
articulas
o inábil instante
quase ao de leve
brejeira
inclina-se o ciúme
do anúncio
Porto Sandeman
e as casas
para te ver passar
já demente
de braço dado.




“A cidade e os seres” de Nadir Afonso


IV

Espera-vos
à Alfândega
tira o pé
da embraiagem
tão inquietos
de tanto
contrabando
de desejos
a maresia
dos seus cabelos
desgrenhados
acentuando
a afogueada
transação de beijos
na Foz
a barra fechada
não resistiu
a um amor subversivo
a resvalar
no cabedal
do banco traseiro
e já ninguém vê nada
entre a lucidez
e a loucura
dos vidros embaciados.



“Os seres e a cidade” de Nadir Afonso

V

No peito
um diadema
de espuma 
no mar salgado
se digladia
e cresce o caudal
de todas as terras
das fragas
e brasões
que os viram passar
contra corrente
na margem
em cada
cave uma revolta
a decantar
a cor rubi
da volúpia
e um cálice
de poesia.





"O privilégio dos caminhos " de Nadir Afonso

VI

Espera-os
a cidade que recobra
a lucidez
e suavidade de gente
cúmplice
nos arredores do tempo
no refúgio
das linhas direitas
que se fez
inamovível
a bater nas rochas
a vida inteira
ouve-se murmurar
o seu olhar
insaciável
em Leça da Palmeira
arrefece
o gin
na Casa de Chá
enquanto esmorece
o frémito
das gaivotas
incendeia-se
o teu corpo
luzeiro
de uma noite
e de uma cidade
sem fim.



"A Gaivota" de Nadir Afonso


Lisboa, 25 de Novembro de 2013

Carlos Vieira